Chapecó/SC – 3 de fevereiro de 2047
A noite já havia descido e as últimas horas daquela data seriam cruciais para entender um pouco do que o Brazil de 2047 podia representar para todo o planeta. Uma coisa era fato: a batalha sulista e um país com o tamanho de um continente dominado por outro país foi um evento catastrófico para o equilíbrio da Terra. Coisas assim acontecem muito raramente. O meteoro que devastou os dinossauros, Primeira e a Segunda Guerra Mundial foram os únicos acontecimentos que provocaram o desequilíbrio terrestre, seja pelo número de mortos ou pelas consequências futuras.
O Brazil vivia uma época de muita exploração norte americana. Quem tinha suas reservas de dinheiro conseguiu sobreviver de maneira digna, a quem perdeu tudo restava apenas trabalhar em campos de exploração de terra, minas, campos de testes nucleares, entre outros locais que precisavam de mão de obra quase que escrava. 2047 também rebaixou o país a uma das maiores taxa de miséria, e a expectativa de investimentos era nula.
Sütter vislumbrava um golpe político com a morte de Remington e o poder do Brazil aos militares. Além de acreditar numa melhora para o país, ele acreditava também que isso faria diminuir suas lembranças e remorsos pelas mortes de companheiros na Guerra Sulista. Os brazileiros não escolhiam seu presidente e seus governantes desde que Porto entregou a nação aos americanos e eleições diretas era algo que dificilmente aconteceria. Sütter sabia disso.
O objetivo de Alex era menor. Vingança por conta da morte de sua mãe e saber quem é o seu verdadeiro pai. Remington disse que era Porto, mas não havia uma prova concreta. E no meio disso tudo, Alex ganhou uma aliada. Alice foi libertada e escolheu vagar pela terra dos vivos com Alex, num romance improvável, mas não impossível.
Mavutsunim estava buscando resolver pendengas das almas boas que estavam perdidas pelo Brazil. Elas eram muitas, pois a guerra deixou muitos mortos confusos e congestionou o submundo. Libertar as almas de Dória, em Nova Andradina, era só um dos objetivos. Os mundos dos mortos e dos vivos estavam desequilibrados. Serápis também percebeu que as almas não estavam chegando ao seu destino e estava ali para impedir que Mavutsunim resgatasse alguns mortos e esvaziasse o submundo das almas ruins. Afinal, em meio a uma guerra há muitas almas ruins. Além disso, ambos precisavam parar a exploração do Brasil, que resultava em cada vez mais mortos.
E Remington, o que fazia ali?
– Alex, rápido, fuja! – gritou Remington.
– Você? – questionou Alex, sem saber exatamente o que fazer.
Mavutsunim levantava um pouco abatido com aquele golpe, por um momento. Apesar de não ser um golpe mortal para um Deus, o tiro de bazuca deixou o índio muito bravo.
– Seu monte de sucata! – Mavutsunim lançou uma espécie de grupo de almas azuladas que rodearam Remington e rapidamente o despedaçaram, revelando que ele era um ciborgue, feito de fios, chips e metal. Alex assistiu aquilo perplexo, sem entender. Até que Serápis apareceu do seu lado.
– Entendeu agora garoto?! Remington é um ciborgue. Aliás, um não, vários. Há diversos Remingtons espalhados por aí, todos controlados pelo verdadeiro responsável pelo país.
– Mas… Quem? – indagou o menino.
– É o que queremos saber. E, pelo que parece, você é uma boa moeda de troca – Serápis se aproximou de Alex e, antes que ele pudesse se preparar com seus poderes alien, o Deus do Submundo das Almas Ruins o fez dormir. Alice saiu do colar para tentar protegê-lo, mas foi interrompida com um estrangulamento. Alice estava morta, mas uma vez na terra dos vivos, Mavutsunim não poderia garantir proteção. Mas poderia atacar Serápis.
– Largue a menina Serápis – gritou Mavutsunim, enquanto corria em velocidade sobre-humana para atacá-lo. Os olhos de Alice avermelharam enquanto era estrangulada. Isso significava que aquela alma boa foi transformada.
– Hahahaha – Serápis riu e um segundo depois desapareceu com Alex e Alice. Para o azar de Mavutsunim, um Deus não conseguia rastrear o outro. Vide a dificuldade de Serápis para encontrar Mavutsunim. Dificuldade essa que não resultou em uma batalha de deuses. Afinal, nem precisou. Serápis parecia querer algo com o Brazil de 2047 e encontrar o responsável pelo desequilíbrio era só o começo.
– Maldito!
– Parece que você foi passado pra trás, Pajé?! – era Sütter, ainda sangrando bastante no estomago, mas com boa parte da pele já restabelecida.
– Serápis é realmente um estúpido. Ele não sabe nem que para matar um vampiro só decapitando.
– Sorte minha, não é? – entre uma tosse e outra, o Major tentava entender o que tinha acontecido – E então… Perdi muita coisa?
– Não tenho porque falar com você. Não vai me adiantar de nada
– E se eu dissesse que posso sentir o cheiro desse monstro que você chama de Serápis? Arranquei um pedaço de sua roupa e sou melhor que um cão farejador – Mavutsunim sentou e analisou a situação. Parecia ser a melhor oportunidade mesmo.
– Você é esperto, criatura. Mas, por que me ajudaria?
– Serápis foi atrás do verdadeiro governante do país, se acharmos ele também, tenho a minha chance de tomar o poder. Aí eu recupero o Brazil, vocês Deuses vão para seus buracos de novo e tudo fica bem.
– Sou um Deus, mas vim do Brazil e não posso permitir que a ditadura militar volte. Muita gente sofreu demais naquela época.
– Índio burro! Posso restabelecer o país!
– Você é pretensioso demais, vampiro. Mas a gente bate esse papo depois que mandarmos Serápis novamente para o submundo e retirarmos do poder o cara que está acabando com um país que já teve 180 milhões de pessoas. Para onde vamos?
Sütter cheirou o pedaço de pano e respondeu.
– Brasília.
Brasília/DF – 4 de fevereiro de 2047
Serápis recebeu um chamamento em forma de invocação em uma mansão subterrânea na cidade de Brasília. Era um senhor com cerca de 60 anos, de camisa social por dentro da calça jeans e sapato. Cabelos grisalhos e com um charuto na boca, sentado em frente à lareira que usou para invocar Serápis.
Atrás dele, o Deus do Submundo das Almas Ruins apareceu.
– Sabia que você me chamaria, homem. Vamos, diga, quem é você?
– Olá Serápis – o homem virou a cadeira – sou Marcos de Oliveira Porto, pai de Cesar Porto.
– Então você é o desgraçado responsável por tudo isso?!
– Meu filho era um covarde, mas era obediente. Infelizmente a parceria com os EUA não deu certo, mas eu tinha as melhores intenções… Mas, como pode ver, agora estou sozinho. Eu fui preso aqui pelo meu filho, depois que tudo saiu dos trilhos. Mas eu estava preparado pra isso. Por isso criei os Remingtons. São máquinas perfeitas com extenso treinamento militar e inteligência própria para tomar decisões. Os EUA gostaram do projeto, adotaram alguns ciborgues para cargos importantes do governo e decidimos colocar um deles para tocar o Brazil no lugar do meu filho covarde. Mas, enfim… A única coisa que ainda prezo é pelo meu neto, Alex. Me dê ele!
– Seu velho safado. Você não se importa, nem nunca se importou com a família. Quer só o poder alien do garoto para escapar daqui. Mas isso não vai acontecer. Alice! Ele é todo seu! – Serápis liberou Alice do amuleto, agora como uma alma ruim, que se aproximou de Marcos e com as mãos rasgou ele no meio.
Mavutsunim e Sütter chegaram à mansão, tarde demais. Serápis fazia um ritual obscuro com a alma malígna de Marcos.
– O que ele está fazendo, índio? – questionou Sütter
– Ele está preparando o terreno para dominar o Brazil. O ritual da polimerização é feito com uma alma genuinamente má e pode unir o submundo com o mundo dos vivos e pro nosso azar, estará unindo o submundo das almas ruins. E se conseguir polimerizar o Brazil, pode ser um ponto de partida para todo o mundo – nesse momento, Alice avista os intrusos e solta um grito agudo, apontando para eles.
– Tarde demais Mavutsunim! O ritual está feito! Esse país agora é dominado pelo meu submundo! – gritou Serápis.
– Vou matar esse desgraçado! – exclamou Sütter, interrompido por Mavutsunim.
– Impossível, Sütter. Não podemos parar o ritual agora. Teremos que ter um plano. Rápido, pegue Alex! – Serápis era envolto por uma nuvem avermelhada. O céu acima dos domínios brazileiros era fechado pelas mesmas nuvens, que coloria as ruas, os campos de exploração e até as cidades fantasmas de vermelho, laranjado e amarelo, numa combinação medonha. Plantações e florestas pegavam fogo, ruas rachavam, o gelo ártico derretia e diversas paisagens eram devastadas pelo calor imenso e tremores na terra.
Mavutsunim fez uma espécie de exorcismo em Alice e retirou a maldade dela, fazendo com que ela desmaiasse em seu braço. Com Alex e Alice, Mavutsunim estava pronto pra sair dali com Sütter. E foi o que fez. Serápis provocou uma enorme explosão, que destruiu o complexo Brazil 21, acima de onde a mansão estava localizada, em Brasília.
Chapecó/SC – 4 de fevereiro de 2047
De volta à Chapecó. Mavutsunim estava tentando encontrar uma estratégia, para evitar que Serápis começasse seu governo no Brazil. Alex e Alice acordaram.
– Que bom que acordaram – disse Mavutsunim.
– O que aconteceu? – perguntou Alex.
– É uma longa história, guri. Mas, resumindo, Serápis dominou o Brazil e pode dominar o mundo com almas malignas.
– E o que vamos fazer? – questionou o garoto.
– Vamos precisar trabalhar juntos. Alex ainda é um alien e sendo de outro planeta pode ser de grande utilidade; Alice se mostrou muito poderosa, deve ter aprendido muita coisa no mundo dos vivos; Sütter é um vampiro habilidoso e tem excelentes técnicas militares; eu sou um Deus do Submundo. Acho que… – Mavutsunim foi interrompido por Sütter.
– Espera… Deixa eu ver se entendi… Você quer que criemos uma droga de Liga da Justiça?… Isso é ridículo. Me inclua fora dessa, índio – Sütter abriu as asas e voou para longe dali.
– Idiota! Vamos ter que fazer isso nós mesmos.
Brasília/DF – 4 de fevereiro de 2047
Quase 12 horas depois do início, Serápis terminou o ritual e podia sentir as almas do submundo ruim entrando na terra dos vivos. Foi quando sentiu uma presença familiar atrás de si. Quando virou, lá estava Sütter.
– Não é muito esperto da sua parte vir me enfrentar sozinho, vampirinho.
– Não vim te enfrentar. Vim fazer uma proposta. Me dê a presidência do Brazil, me deixe governar uma nova ditadura militar.
– E o que eu ganho em troca?
– Minha lealdade.
– Esta é uma série de ficção e nada do que foi escrito aqui condiz e/ou foi baseado em fatos reais ou opinião se seus autores. A obra é de direito restrito do site Sintonia Magazine e sua reprodução é regrada à prévia autorização de seus criadores –